A culpa e o isolamento
- Anderson Torres
- 8 de nov. de 2021
- 3 min de leitura
Um processo de luto, geralmente, apresenta dois fatores quase sempre comuns: dilema e culpa. A culpa é a emoção de resposta a um dilema vivenciado em um processo de luto. A culpa surge quando tomamos consciência das nossas limitações enquanto pessoas.
Ela surge quando proferimos uma “má resposta” numa determinada ocasião que nos causou arrependimento, mas sobre a qual não pedimos perdão. Isso acontece em casos quando não percebemos a gravidade da situação de saúde de um ente querido que acabou por falecer estava, ou porque tomamos um conjunto de decisões (durante o processo do morrer e da morte) que agora nos pesam na consciência e nos corroem e isso dificulta a integração plena e saudável do luto.
Devemos aceitar a culpa como uma emoção natural e validar os motivos que a sustentam. Comumente, estes motivos implicam aquilo que se fez e o que se desejaria ter feito, quase como que fantasiando uma outra realidade que não aquela a qual o enlutado foi obrigado a enfrentar: a morte de alguém que era tão especial e importante para si.

Há um desejo latente de voltar atrás no tempo e mudar a decisão tomada, como se essa decisão pudesse suavizar a dor. O conjunto de decisões a tomar quando a perda pode, no futuro, significar o surgimento de dilemas que podem, por sua vez, complicar a integração saudável de um luto.
Após a validação da culpa, surgem outras emoções, como o medo que surge como forma de reação à necessidade de não esquecer de quem perdeu e de aceder às boas memórias e recordações vividas com ele. Há uma clara sobreposição de associar às memórias e recordações que necessitam de ser mantidas e geridas dentro de um futuro não vivido de incompletude (Mallon, 2011).
Isolamento
Para analisar o luto como uma das atitudes diante do isolamento, é necessário compreender que estas manifestações passaram, desde o início do século passado, por alterações no que diz respeito à sensibilidade coletiva na percepção e na expressão dos sentimentos causados pela consciência do luto. “Na realidade, trata-se de um fenômeno absolutamente inaudito. O luto, tão presente no passado, de tão familiar, vai se apagar e desaparecer. Torna-se vergonhoso e objeto de interdição” (ARIÉS, 2003).
Para Sigmund Freud (1996), o processo de luto, especialmente quando decorre da perda de alguém próximo, proporciona ao indivíduo a falta de interesse pela própria vida, tamanha a intensidade do pesar. É necessário pensar, ainda, na permanência do morto na consciência dos sobreviventes.

O processo do luto representa um afastamento do estado de saúde e bem-estar, ou seja, um momento de desequilíbrio da saúde emocional que acontece diante de uma perda. Contudo, o que pode ser uma novidade para muitos é que o luto não acontece somente em situações de perda por morte, mas também por outros tipos de perdas como da segurança financeira, da liberdade, da integridade física e saúde, da perspectiva de futuro, etc.
Diversas reações são comuns no processo de luto como choque, negação, ansiedade, desorganização, desespero e impotência experimentadas intensamente e sobrepostas (em alguns momentos). A ambivalência também é comum de ser sentida. Diante desse momento desafiador que estamos vivendo, o de uma pandemia global, é possível afirmar que estamos passando por um luto coletivo, visto que as reações supracitadas e ainda o sentimento do medo atingem todos os seres humanos, independente de idade, etnia, sexo, nível socioeconômico e religião (Franco, 2002).
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Referências
Ariès, P. O homem diante da morte (Vol. II). Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1982.
FRANCO, M. H. P. (org.). Estudos Avançados sobre o Luto. Campinas, São Paulo: Livro Pleno, 2002.
FREUD, S. Sobre a psicanálise. S. Freud, Obras completas, v. 12, 1996.
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